segunda-feira, novembro 30, 2020

 Pensamentos confusos n° 2


Será que quando o corpo se esgota, exaurido, a mente para também? Acredito que não. 

O corpo desaba numa cama desarrumada, me meio a um quarto de uma casa parcialmente abandonada. Ao olhar para o teto, acompanho o lento girar de pás de um ventilador igualmente cansado. Os pensamentos produzidos por uma mente ainda ativa me levam para muito longe dali...

O roteiro varia de acordo com a sobriedade, atualmente bastante alterada. Enquanto a mente viaja, o corpo afunda na cama. Olho para o lado procurando alguém que não está lá.

Ausências reais transformam a saudade em dor. Não uma dor física e sim na alma. 

Aflito fecho os olhos e deixo o cansaço me ocupar plenamente. E assim saímos do corpo sem saber se queremos ou não voltar.


Delírios escritos em algum momento pelo ano de 2018.... papéis encontrados na última mudança

Pensamentos confusos n° 1


 Imóvel. Me sinto assim e talvez seja uma face do sofrer. Cada um sofre de forma particular... enquanto uns calam, outros explodem e ao explodirem, fragmentam-se, se espalham. Estou espalhado, fragmentado, dividido.

Uma noite em cada lugar, nos braços de outras pessoas, dentro delas, dentro de mim.. vãs tentativas de preencher vazios, só que com mais vazios, num jogo de soma zero.

Enquanto a mente divaga, o corpo padece. Cansaço. Olhos pesados e sentimentos confusos.

Correndo para lugar nenhum, sem pódio de chegada, nem beijo de namorada... cachorro correndo atrás do rabo, sem nunca alcançar. Solução?

Procuro sem muito afinco uma forma de sair dessa espiral sem enlouquecer. Terei sucesso? Ouso nem querer saber...


Papéis perdidos, ideias soltas escritas em 2018 e recentemente achados... 

segunda-feira, janeiro 08, 2018

E ele entrou em casa. Sentou. Olhou para os gatos que começaram a ronronar, como se implorassem por atenção. "Os gatos não são assim", pensou enquanto olhava o celular para saber se ela havia falado com ele. Silêncio do outro lado.
As últimas semanas não foram simples dias no decorrer de um calendário. Ele sofrera como nunca sofrera até então. Descobrira o amor ao mesmo tempo que o via escorrer entre seus dedos. E sentado na sala sentia as lágrimas caírem em seu colo.
Nunca tinha chorado desse jeito. Real. Verdadeiro. Não era por conta de uma dor física, embora ainda confundisse tudo pela falta de experiência. Os olhos estavam alagados, a garganta engasgada, a voz não se fazia presente. Desaprendera a chorar.
Entre soluços e sons indescritíveis, as lágrimas molhavam sua camisa, evidenciando o óbvio: eram reais. A pergunta talvez fosse simples: qual era a razão dequele pranto tão sofrido?
As razões eram muitas mas possuíam a mesma origem. Aprendera, da maneira mais tosca que certos ditados eram reais. "Só se dá valor quando se perde". Era essa a frase que reverberava diariamente em sua cabeça, agora perdida em devaneios. Tivera o amor de sua vida em mãos e, por falta de tudo, deixara escapar...
A pergunta que agora tomava conta de sua pessoa era apenas uma: "seria possível reconstruir esse amor?". Utópico por definição acreditava que sim, pois para ele a utopia era apenas aquilo que ainda não aconteceu. Desprezava impossibilidades. Ciente disso tomou mil decisões, jurou seguir todas elas, pois um simples fracasso colocaria tudo a perder. E ele não queria perder nada. Principalmente ela.
Solitário, encheu a taça de vinho, deu um longo gole, esperando encontrar no álcool as respostas que não obtinha na sobriedade. Olhou novamente para o celular e percebeu que ela havia respondido. "Finalmente!", exclamou confiante. De um só gole sorveu a taça e levantou. Abriu a porta e jogou-se no mundo, atrás do seu amor utópico.

segunda-feira, julho 27, 2015

O professor entra em cena. A sala se apresenta vazia, embora lotada de pessoas. A solidão do mestre o impedia de perceber os presentes. Mecanicamente se dirige ao quadro, olha para o relógio e escreve: Rio, 27 de maio de 2013; História; Seu nome. Todo dia ele faz tudo sempre igual.
Procura na primeira fileira um aluno qualquer e pergunta onde havia parado na última aula. Monta o quadro com a informação obtida e espera a turma copiar. O pensamento voa.
Um vazio ocupa o lugar da alma. A rotina é um moinho, triturando a novidade, a alegria, a vontade de despertar para um novo dia. Tudo estava sem sabor. Chegou a hora de recomeçar.
Num gesto súbito sai da sala sem nada falar. Passos firmes o guiaram até a porta que foi aberta com violência, de uma só vez. Os alunos nada entenderam quando viram o professor encher os pulmões e dar um grito. Um grito não, um berro. Daqueles gruturais, Um tipo de som que o ouvido humano não está habituado a ouvir. O som produzido remete aos mais antigos ancestrais do homem. O olhar rútilo, a veia do pescoço saltada, a saliva expulsa da boca durante o grito.
Os alunos não sabem como reagir. O professor fecha a porta, caminha tranquilamente até o tablado enquanto arruma a camisa e limpa a boca. Chega em frente ao quadro, vira-se, olha para os alunos que não sabem como reagir e serenamente diz: "Bom dia a todos! Na última aula....".
Pronto. A monotonia estava quebrada. Pelo menos hoje.

segunda-feira, abril 28, 2014

Final da tarde, estou sentado na mesa de um bar e várias garrafas vazias ocupam a mesa. Cercado de amigos novos, compartilho novas histórias e dou uma outra roupagem a velhas histórias que contadas nesse grupo ganham o ar da novidade.
Copos vazios são novamente preenchidos, mais gargalhadas rompem a noite, nunca barulhenta o suficiente. Embora o momento fosse ótimo, faltava alguma coisa, faltava até o celular anunciar, discretamente, a chegada de uma mensagem.
Ao abrir a mensagem o sorriso ocupa o rosto e a memória é convidada a participar dessa noite. Em pouco tempo, o que era uma mensagem torna-se presença e o passado se materializa na mesa.
O riso é ainda mais intenso e os assuntos conversados, por mais que remetam ao passado, parecem muito mais recentes. O tempo afastados nada parece significar e a harmonia é a mesma de anos atrás.
Obrigado por ter voltado.

domingo, abril 24, 2011

Cotidiano

Silêncio. Acordou e olhou para os lados. Estava só. Mais uma vez. Levantou-se, despiu-se, banhou-se, vestiu-se e fez o almoço. Eram duas da tarde de um domingo, dia dedicado aos almoços de família ou aos solitários.
Tomou uma dose de coragem e saiu de casa, em direção a rua, buscando o que fazer para preencher as horas entre o ócio e a segunda feira, dia de retorno ao trabalho. Caminhava pelas ruas do centro da cidade, que estavam vazias, numa clara oposição aos dias da semana, quando estão abarrotadas, pessoas no frenético ritmo diário, imposto pela vida moderna.
As ruas vazias são um convite a observação e ele pode sentir a cidade, seus cheiros, sons, gosto. A cidade se descortinava, e era um lugar novo, pronto para ser descoberto, redescoberto.
Em seus muitos anos de vida ele sempre fez o mesmo roteiro, mas sempre parecia a primeira vez. Atentamente, observou as construções, ricas em detalhes. Gastou um longo tempo reparando suas cores, desenhos e sombras. Lamentou a miséria, sentiu pelas pessoas que viviam nas ruas, sem nenhuma perspectiva. E nesse quesito os via como iguais. Olhou o relógio.
Volta para casa. Abre a porta. Entra e senta no sofá. Sozinho outra vez. Liga a televisão para gastar os últimos minutos do domingo. Nem percebe quando os olhos se fecham, dando lugar a uma nova realidade, onde, cercado de amigos, aproveita algo tão raro: a companhia de velhos conhecidos.

sexta-feira, dezembro 10, 2010

Sobre a vida

e ele completou 50 anos. Na mesa do restaurante contemplou os amigos feitos ao longo de sua vida.... meio século pensava... olhou para o lado e viu a esposa, 25 anos juntos e mesmo assim, cercado de amigos e da mulher se sentiu sozinho. Gostaria de tê-la ao seu lado.
Prestes a completar 50 anos de idade se apaixonou novamente. E não foi por sua companheira de 25 anos. Foi por outra mulher. Uma menina comparada a ele. 25 anos era a sua idade. Se era correspondido? Não sabia, mas percebia no olhar dela o quanto sua companhia era, no mínimo, interessante.
Um homem de 50 anos. 2 filhos. Carreira constituída, sólida. Mulher ainda apaixonada. Planos, coisas a realizar. E incrivelmente apaixonado por uma menina. Dúvidas que não mais deveria ter. E mesmo assim sofria.
As semanas anteriores ao seu aniversário foram maravilhosas. Amigos ligando para saber como seria a comemoração do aniversário. Filhos animados com a chance de ver o pai bêbado. Mulher ansiosa com a festa e ele... ele só pensava se valia a pena largar tudo em nome de uma paixonite, algo que só sente quando adolescente, mas que ele julgava estar sentindo. Na sua cabeça um só nome, o nome dela.... sua imagem, seu sorriso, seu olhar....
Idiota, os amigos o chamavam.... ela é nova demais para você.... não vale a pena largar o que você tem.... ela vai te usar e te largar.... você é apenas uma distração, nada demais..... e essas frases povoavam sua cabeça e ele nada fazia... pensava.
Olhava para trás.... lembrava do tempo que passara com ela.. sim, ela alimentou seus sonhos de ficarem juntos, muito embora ele julgasse algo impossível.... sentia saudades dela... ciúmes dela... sabia que ela tinha outras pessoas, outras bocas. Mas ainda acreditava que com ele era algo especial. Vã ilusão.
Olhou em volta. Amigos, mulher, filhos. Bolo de aniversário, mesa repleta de garrafas de cerveja. Pratos vazios. Sua mulher sorria em sua direção. Não sabia o que fazer. Agonia, peito apertado. Fechava os olhos e lembrava dela, a rainha das incertezas. Nunca havia conversado com ela a respeito disso tudo, do que sentia. Para ela poderia ser apenas diversão, para ele, uma deliciosa possibilidade.
Cantou parabéns, abraçou os amigos, beijou os filhos e a mulher. Fechou os olhos, fez um pedido.... abriu os olhos sabendo que nada havia mudado. Mais alguns apertos de mãos, abraços.... sorriu por ter os amigos por perto. Esperou mais um pouco, respirou fundo e olhou a sua volta, na expectativa de vê-la.... nada aconteceu.
Foi para casa, bêbado, deitou em sua cama e esperou sonhar com ela, pois pelo menos ali, em seus delírios, era possível estarem juntos....

quarta-feira, julho 21, 2010

Diálogo entre um adolescente e um sábio chinês

Tarde de domingo e o adolescente caminha pela Quinta da Boa Vista, pensando na namorada, que agora é uma ex, a sua primeira ex. Inconsolável, ele se aproxima de uma árvore, onde um senhor de olhos puxados joga damas contra ele mesmo. O jovem se aproxima, reconhece aquele senhor, pois sempre o vira sentado ali, e inicia um assunto, que mais parecia um monólogo.
Desfilou uma enorme lista de problemas, falou e falou e o velhinho se limitava a empurrar as pedras pelo tabuleiro. Quando o jovem perguntou....
- Senhor, você acha que eu falei demais, que eu não deixava ela falar sobre a gente e acabei dizendo besteiras?
- Existem coisas que após feitas não podem ser refeitas como a flecha lançada e a palavra dita.
- Mas senhor, todos na minha família eram contra nossa namoro!
- Sem a oposição do vento, a pipa não alcança os céus.
- Oposição do vento? O problema também era o Cláudio! Ele vivia dando em cima dela!
- Dois tigres não podem ocupar a mesma montanha.
- Tigres? Ah? Outra coisa, existiam outros problemas.... eu a amava mais sei lá....
- Por maior que seja a montanha ela é incapaz de tapar o sol.
- Que montanha senhor? Onde estás vendo uma montanha? E tem mais... ela dizia que eu falava muito de mim, que sempre me colocava na frente de tudo e dela também... mas era exagero dela!
- Devemos ser humildes como o pó.
- Caramba! Acho que o senhor caducou de vez! Também, fica o dia inteiro aí, sem falar com ninguém e jogando contra você mesmo! Deve estar maluco mesmo.
- Se as suas palavras não podem ser melhores que o silêncio, mantenha o silêncio.
O velhinho fechou o tabuleiro, e se levantou. O jovem, mais confuso do que já estava, colocou as mãos na cabeça, num ato de desespero, sem saber o que fazer. O velhinho olhou para ele uma última vez e disse:
- O futuro é um mistério, o passado já passou e o agora é uma dádiva, por isso que se chama presente.
Dito isso, caminhou tranquilamente em direção ao sol poente e nunca mais sentou a sombra daquela árvore, onde o jovem ficou até entender tudo o que foi dito.